segunda-feira, 28 de novembro de 2005

Ser ou nao ser gay, eis a questao

Este fim de semana viu-se lá em casa o DVD de "O mercador de Veneza". A recente adaptação da peça de Shakespeare ao cinema que causou alguma polémica por causa de uma suposta "carga homoerótica", especificamente uma beijoca entre o Jeremy Irons e o Ralph Fiennes. Não sei porquê tanto burburinho, os rapazes mal roçam as barbas! Estava á espera de mais língua. Mas enfim... De qualquer maneira tem de se levantar o polegar a esta adaptação (já que não se levanta mais nada...) porque, sem o sublinhar da relação amorosa entre aquelas duas personagens masculinas, o enredo não faz lá grande sentido.
Finalmente compreendo porque é que esta é daquelas peças do Shakespeare que quase ninguém conhece (eu inclusivé não fazia idéia do que era a história). Para começar, o enredo é complicado à brava e não se consegue tirar uma moral simples da coisa. Depois, a tal coisa de o subtexto homoerótico precisar de vir à tona para que os diálogos e motivações das personagens possam fazer sentido (santo deus, a ponto de as três personagens femininas se vestirem de rapaz e os respectivos maridos fazerem comentários alarves sobre ir para a cama com rapazitos!!! No tempo do Shakespeare em que só havia actores masculinos em palco a coisa devia ser de gritos...). E depois, a personagem complexa do judeu Shylock (aqui numa interpretação genial do Al Pacino) que, está-se mesmo a ver, numa má leitura, irá descambar sempre num tom anti-semítico.
Porque o que é curioso nesta adaptação é que, dando verdadeira expessura às personagens, se compreendem os seus motivos e, de repente, não há ninguém que seja verdadeiramente o mau da fita. São antes todos simples humanos, com falhas e imperfeições.
Curioso é ainda a actualidade da obra que, para além da mensagem sobre a intolerãncia, fala ainda sobre a questão do materialismo, ganância económica e endividamento. Quando se apanha o metro em Lisboa e se vê todos os anúncios de agencias dispostas a emprestar dinheiro para que nos possamos endividar neste natal não podemos deixar de nos perguntar: que diferença há entre três mil ducados e três mil euros? A resposta é: os três mil ducados vêm em moedas de ouro dentro de um cofre, os três mil euros são um número impresso no extracto do multibanco.

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